quinta-feira, 28 de abril de 2011

Entre uma história e outra

ENTRE UMA HISTÓRIA E OUTRA é o espaço para trocarmos experiências e potencializarmos nossa percepção do mundo, da história, do outro e de nós mesmos.
Para mim será um desafio mantê-lo atualizado e movimentado. Conto com meus aluninhos para que, de fato, possamos tirar proveito das várias possibilidades oferecidas por esse tipo de ferramenta. Claro, conto com os amigos também, para darem pitacos, críticas e sugestões.

O aluno, o professor, a escola

Alves, Rubem; Antunes, Celso. O aluno, o professor e a escola: uma conversa sobre educação. Campinas, SP; Papirus, 7mares,2011.

Despertar a fome de aprendizado nas nossas crianças e adolescentes e contribuir para tornar mais prazerosa e efetiva a relação dos estudantes com o conhecimento e com a escola são alguns dos desafios postos, aos professores e gestores escolares, por Rubens Alves e Celso Antunes, dois grandes educadores brasileiros. Em O aluno, o professor e a escola: uma conversa sobre educação, os dois conversam, despretensiosamente, sobre seus percursos pessoais e profissionais, seus posicionamentos sobre a educação, a escola e a necessária e difícil relação entre alunos e professores. O texto é fruto de um encontro num clima muito agradável e descontraído entre as folhagens de um jardim. O momento de reflexão sobre a educação foi filmado e está encartado como DVD no livro recém publicado conjuntamente pelas editoras Papirus e 7mares.
A conversa entre Rubem Alves e Celso Antunes desloca a reflexão das mazelas estruturais, de planejamento, carreira, gestão e burocracia que assolam nossas escolas públicas, nosso sistema de ensino e nossos docentes, e enfatiza o debate sobre a própria identidade docente, sobre a responsabilidade do professor por sua formação contínua, seu compromisso de ser um eterno estudante e, antes de tudo, de ser um apaixonado pela leitura, pelo conhecimento e pela formação de saberes. O que se coloca é a necessidade do próprio professor ser um “esfomeado” pela aprendizagem, pela leitura, pelo ambiente de construção de autonomia e livre pensar. A metáfora da fome é apropriada por Rubens Alves de uma frase da escritora Adélia Prado: “Não quero a faca nem o queijo. Quero a fome”.
Quantos de nós, ao participarmos como formadores de professores em cursos de especialização ou extensão, nos deparamos com professores esfomeados, ávidos por novos conhecimentos, por descobrir teorias e metodologias de ensino-aprendizagem, por refletir sobre sua práxis e construir seu caminho como um profissional intelectual? Quais os interesses que mobilizam os docentes das escolas públicas a buscarem a formação continuada? Como os licenciandos, nossos estagiários, encaram a prática de ensino? Com prazer ou como uma mera obrigação para receberem o diploma de curso superior e, muitas vezes, seguirem carreiras completamente diferentes? Como esses sujeitos, em sua maioria, desmotivados, descrentes com a educação podem despertar o desejo de aprender dos nossos alunos? É necessário que o professor transforme a escola, seus conteúdos e métodos para poder criar a fome de aprender, para poder estimular nossas crianças a pensarem de forma autônoma para a vida e o mundo. Mas, é necessário que ele comece por transformar a si mesmo. Segundo Rubem Alves, é necessário sermos um novo tipo de professor, o “professor de espantos”, que educa o olhar, que incentiva os questionamentos muito mais que as respostas, que ensina-nos a ver o mundo e não apenas a olhar.
Sem dúvida, o papel da universidade e, principalmente, dos centros de formação de professores, é imprescindível nessa tarefa de formar sujeitos com vontade de ensinar, com amor pelo ensino. Claro que não podemos ignorar as questões salariais e materiais das escolas, mas, a conversa de Rubem Alves e Celso Antunes torna a discussão mais complexa, nos incita a pensarmos sobre o poder transformador do docente e de como, muitas vezes, ao saírem dos cursos de licenciaturas, com meia dúzia de teorias na cabeça e um horizonte profissional obscuro pela frente, os recém – formados não refletiram ou vivenciaram suficientemente a experiência, intensa e profunda, do ser professor. Grande parte já chega às escolas, principalmente, às públicas, insatisfeitos, pessimistas e cansados, sem nenhuma potência para construir uma prática fresca e renovada.
O que fazermos para alterar todo esse quadro? Como contribuirmos para a formação de “professores de espantos”, de docentes com uma auto-estima bem resolvida e com orgulho de assumir a profissão publicamente? Como formarmos sujeitos capazes de despertar a fome de aprender? Não sabemos completamente a resposta. Aqui e acolá surgem lampejos para mudar essa situação. Rubem Alves e Celso Antunes não nos deixam a tão desejada fórmula. Mas, sem dúvida, contribuem para aumentar nosso compromisso e disposição na busca de caminhos; contribuem, principalmente, para nos (re) encantarmos com a docência e, talvez mesmo, para bagunçar nossas certezas sobre o ser professor. De toda forma, se nosso conhecimento sobre o aluno, a escola e o professor ainda continua caótico, lembremos de Nietzsche: “É preciso ter um caos dentro de si para dar à luz uma estrela cintilante”.
Natália Barros
Abril/2011.